Ninfomania: O que é? Como identificar? Como tratar?

Você conhece alguma pessoa ninfomaníaca? Sabe realmente o que significa essa palavra? Se chegou até aqui é porque quer descobrir algo, então siga a leitura sem pudor e sem temor.

Acho muito curioso como as palavras podem criar grandes fantasias na mente das pessoas, principalmente quando estão associadas a algo que a sociedade, no geral, ainda não lida muito bem.

Por muito tempo, a palavra ninfomaníaca foi usada para se referir as mulheres que revelam mais a sua sexualidade do que o esperado pela sociedade.

Seja o que pensam, sentem, falando ou praticando coisas sexuais que antes pareciam exclusivas dos homens.

O que é ninfomania?

Atualmente, ninfomania, junção de ninfa (mulher jovem esbelta) e mania (loucura, fúria), é um termo não oficial usado para descrever o transtorno de comportamento compulsivo sexual, especificamente em mulheres.

Quando identificado em homens, o problema é chamado de satiríase ou donjuanismo.

Esse último vem de Don Juan mesmo, o personagem que transou com milhares de mulheres, e que invade o imaginário afetando o comportamento de muitos homens (guarde na memória esta ideia, voltaremos a ela).

Apesar das pessoas reconhecerem a palavra ninfomaníaca, nem mesmo profissionais especialistas na saúde sexual conseguem chegar a um entendimento do que é uma compulsão sexual, pois esta é uma questão que, primeiramente, diz respeito à própria pessoa, à sua individualidade e os desejos que ela possui.

Ninfomania Don Juan de Marco

Senta que lá vem história

No passado, a palavra ninfomaníaca foi amplamente aplicada a mulheres consideradas “excessivamente sexuais”.

Alguns tratamentos médicos eram aplicados de forma extremamente cruel. Diagnósticos errados levavam mulheres a terem seus clitóris decepados, seus cérebros eletrocutados e seus ovários removidos.

A sangria da vagina e banhos frios forçados também eram comuns (qualquer semelhança com uma caça às bruxas, não é coincidência).

Somente em 1980, a palavra ninfomania foi finalmente removida do Manual de Transtornos Mentais (DSM), deixando assim de ser tratada como doença.

A masturbação e a homossexualidade foram retiradas da classificação de doenças muito tempo antes disso.

Em 2018, a Organização Mundial da Saúde lançou uma nova versão da Classificação Internacional de Doenças (CID-11) que incluía, pela primeira vez, o comportamento sexual compulsivo como um distúrbio de saúde mental.

Resumindo então, no nosso tempo, quando corretamente diagnosticada, uma mulher ninfomaníaca pode ser, na verdade, uma pessoa obsessiva com pensamentos, impulsos ou comportamentos sexuais que podem causar sofrimento ou prejudicar sua saúde, seu trabalho e seus relacionamentos.

Esta compulsão faz com que a mulher tente preencher algum vazio ou buscar algum tipo de alívio através de diferentes práticas sexuais.

Outras compulsões que não são sexuais, funcionam de forma parecida (exemplos: comida, bebida, jogos).

Sobre a repressão da sexualidade feminina

Lembra do filme “Ninfomaníaca” de 2014?

Foi dividido em dois volumes que trouxeram a sugerida compulsão para discussão geral.

Joe, a protagonista, apresenta-se como uma pessoa perversa e má, algo que demonstra o comportamento de autodesprezo dos compulsivos sexuais.

Porém, o filme foi responsável pela reafirmação de um mito: a mulher ninfomaníaca transa com todos os que passam por seu caminho.

Algumas pessoas acreditam que elas irão assediar qualquer pessoa a qualquer momento e em qualquer lugar, mas, o que as pessoas não compreendem, é que na maioria dos casos de compulsão sexual não existe uma vontade de transar com qualquer um, mas sim um desejo incontrolável de se satisfazer sexualmente.

Curiosamente, mulheres que têm iniciativa e buscam o sexo sempre foram rotuladas, independente de compulsão sexual, pois não se falava tanto sobre isso e, numa cultura ainda machista, acredita-se que mulheres são submissas aos homens.

A responsabilidade e iniciativa para o sexo em um relacionamento continua sendo associada ao homem ainda hoje.

Dessa forma, uma mulher com iniciativa ou empoderada da própria sexualidade, sai do “padrão” esperado pelas pessoas e acaba sendo rotulada “ninfomaníaca”.

Assim são criados muitos mitos sobre uma mulher insaciável por sexo, e isso acaba também sendo explorado pela indústria pornográfica machista.

No caso dos homens, dificilmente consideram um transtorno quando ele se envolve com muitas mulheres (lembram do Don Juan?).

Isso porque o envolvimento sexual com muitas mulheres ainda é tratado como algo comum pela maioria das pessoas.

O que provoca a compulsão sexual?

Antes de tudo, é bom deixar bem claro que existe uma enorme diferença entre uma pessoa ser compulsiva e uma pessoa gostar muito de sexo.

Ter uma vida sexual intensa não é um sintoma da compulsão sexual. Ter muita vontade de transar não caracteriza um transtorno.

A diferença é que a pessoa compulsiva não consegue resistir aos pensamentos e desejos, que precisam ser saciados no mesmo momento, não importando como, onde e, às vezes, nem com quem.

Não há uma causa única, isolada ou específica para o surgimento dessa ou de qualquer outra compulsão.

Existem algumas hipóteses da origem da compulsão sexual:

  • O abandono físico ou afetivo dos pais nos primeiros anos de vida gera traumas que podem se tornar diversas compulsões (como a alimentar);
  • Pode ser uma tentativa de suprir alguma falta na vida da mulher, ou uma forma que ela encontrou para aliviar algum estresse;
  • Pode ser derivado de um histórico de abusos sofridos;
  • Em alguns casos tem relação com fatores biológicos (hormônios e metabolismo);
  • Para muitos casos existem questões repressoras, morais, vergonha e culpa que acompanham a educação.

Que fique claro então, não existe um conjunto de normas para estabelecer se o desejo sexual da mulher passou do limite da normalidade.

O desejo é algo pessoal, que varia entre pessoas. Se há compulsão e afeta negativamente a vida, a mulher pode buscar voluntariamente por ajuda.

Observando casos reais

Por muitos anos atendendo casos verídicos de mulheres com compulsão sexual, pude observar alguns elementos que estão presentes no comportamento e vida dessas pessoas.

Percebi que na maioria delas existe uma dificuldade de pensar e se concentrar em coisas que não estejam relacionadas ao sexo (fala e discurso sexual predominam).

Além disso, outra característica presente paralela a compulsão é agir por impulso (sem pensar ou planejar) em diversas outras coisas-situações do dia a dia.

Um dos maiores desafios em tratar essa “condição” em que elas se encontravam (condição presente na maior parte da vida delas, algumas desde a infância) é o fato do assunto ser diretamente relacionado ao prazer, seja o prazer quando sentiam ou na falta deste sentimento-sensação.

A compulsão em si não incomodava tanto elas, mas sim as consequências (dispersão, falta de compromisso, falta de apego e empatia).

Para que elas superassem ou simplesmente vivessem melhor a vida social ou os relacionamentos, foi necessário tratar a compulsão partindo dos elementos mais simples e corriqueiros evoluindo para os mais complexos.

Dos mais simples: entender sobre o tema e expandir o próprio conhecimento sobre sua sexualidade; superar barreiras sociais de preconceito e superar traumas que foram criados pelo julgamento recebido.

Dos mais complexos cada caso segue um caminho diferente tanto na interpretação que a pessoa tem sobre si e sobre a vida, como o valor que ela dá para o sexo, o prazer e o desejo nas relações que estabelece.

Bom senso X Senso comum

A compulsão sexual está presente em cerca de 5% da população geral, havendo uma predominância do sexo masculino (mais Don Juans do que ninfomaníacas no mundo).

A proporção de pessoas que buscam tratamento é de 8 homens para cada mulher, tornando assim os casos delas mais raros de serem alcançados, atendidos, estudados e compreendidos.

O senso comum ainda acredita que os homens pensam em sexo a todo momento e isso justificaria sua compulsão quase inevitável.

Acreditam por isso ser natural que homens traiam mais, pois tem mais dificuldade de conter a libido. A culpa, supostamente, é da testosterona.

Até mesmo diante da satiríase (Donjuanismo), podemos ouvir de alguns pacientes que é próprio do homem um apetite sexual elevado. Culturalmente, o sexo ainda é tratado como coisa deles.

Dizer que os homens apresentam mais desejo ou mesmo mais compulsão sexual que as mulheres é não levar em consideração interferências da moral, cultura, politicamente correto e os chamados “bons costumes”.

Sinais e sintomas da compulsão sexual

Apesar de não haver uma fórmula definitiva e confiável, alguns sinais podem ser observados por amigos e familiares.

Os sintomas são apresentados pela própria mulher (o que pensa e sente). Alguns em destaque:

  • Masturbação excessiva e uso exagerado de pornografia: também fazem parte da compulsão quando resistir a eles se torna impossível;
  • Uso exagerado de objetos diversos: brinquedos sexuais ou qualquer material são utilizados de forma excessiva, seja sozinha ou com parceria, sem conseguir saciar o apetite sexual;
  • Fantasias sexuais frequentes e intensas: pode ocorrer a qualquer momento, em qualquer lugar e na presença de qualquer pessoa. Quando não consegue controlar as fantasias, sente-se ansiosa ou deprimida;
  • Múltiplos parceiros sexuais e alta frequência: fazer sexo todos os dias e procurar muitos parceiros, por si só, não é compulsão. O que caracteriza a compulsão é não conseguir resistir ao impulso do sexo, não importa a hora e o lugar. É uma necessidade incontrolável, com sentimento de urgência, e que leva à procura de mais de um parceiro no mesmo dia.

Consequências da compulsão sexual

Engana-se quem acha que uma mulher com compulsão sexual sente prazer em toda e qualquer relação.

Pelo contrário, a busca interminável por preencher um vazio tão grande só traz angústia, insatisfação e sofrimento.

Por isso, é muito comum que a compulsão venha acompanhada de ansiedade ou depressão.

Como muitas destas mulheres sentem vergonha pela sua condição, acabam se isolando socialmente também.

Algumas mulheres relatam que foram despedidas por passarem muito tempo no banheiro do trabalho se masturbando.

Outras foram expulsas da escola por assistirem à aula no fundo da sala para se masturbar ao som da voz do professor.

Muitas confirmam uma excitação sexual apenas por ver um homem que lhe chame atenção e desperte fantasias.

Também possuem uma vontade de querer tocar-se em locais públicos ou mesmo se esfregar em alguém (frotteurismo mais comum praticado por homens em ônibus e metrôs).

Independente da compulsão, ninfomaníacas, mais do que Don Juans, ainda são tratadas como marginais sexuais por vivermos em uma sociedade que sempre temeu a manifestação do desejo feminino.

Ainda hoje a mulher que manifesta suas vontades e desejos sexuais sofre um “apedrejamento” moral.

Uma nova forma de olhar a sexualidade está surgindo

Mas é importante observarmos que há uma revolução acontecendo na internet.

As terapeutas sexuais, educadoras, sexólogas, influencers, youtubers, canais de empoderamento feminino, de aprendizado sobre o corpo, sexo e prazer estão virando este jogo.

A exposição de ideias acerca do desejo sexual feminino ajuda muito a desconstruir preconceitos condicionados na história sexual delas, tais como: sexo com qualquer um em qualquer lugar como forma de saciar o desejo, sexo como forma de negociação (troca por afeto, por companhia, por respeito, por dinheiro ou trabalho).

A grande vitória na vida das mulheres é poderem gozar livremente e falar abertamente sobre o que querem no sexo (quebrar barreiras do diálogo, se libertar para o prazer, gozar, experimentar algo novo, encontrar o objeto de desejo maior).

Com isso conseguem superar a lógica do universo pornô machista para o tipo de sexo desejado para a própria vida, com seus fetiches reais.

Existe Tratamento?

A recomendação é a terapia sexual como tratamento para quem sofre com a compulsão sexual.

Esta terapia se baseia em conseguir um controle dos impulsos sem que pra isso se perca a satisfação sexual.

Na prática são sessões com cerca de 60 minutos de duração (também online) onde vamos esgotando os assuntos que mais perturbam a mulher e avançando nos temas úteis para seu aprendizado e ressignificação do sexo.

Junto a terapia, em alguns casos, é importante buscar um médico psiquiatra para indicação de algum medicamento inibidor do desejo num primeiro momento.

Por fim, todos precisamos nos abastecer de informações sobre sexo, compulsão sexual e desejos sexuais. Isso para desconstruir todo o preconceito que temos sobre assuntos tabus.

Para esta e outras questões, agende uma consulta online, podemos lhe ajudar a compreender e viver muito melhor com sua própria sexualidade.

Fontes:

Marcos Santos psicólogo especialista em sexualidade
Marcos Santos

Marcos Santos é Psicólogo, Sexólogo e Terapeuta Sexual com 10 anos de experiência. Ele é Especialista em Sexualidade Humana, com formação em Sexologia e Educação Sexual.


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